Últimas notícias:

Le Monde: jornal francês publica com destaque artigo de Lula

No texto, ex-presidente reforça seu compromisso com a democracia e o desenvolvimento social.

Por Anderson Augusto Soares - Crítica21
17/05/2018

Edição do Le Monde desta quinta-feira (17) traz Lula como destaque.
Foto: reprodução.
Ao contrário da mídia hegemônica brasileira, a imprensa internacional tem publicado mensagens de apoio a Lula além de adotar uma narrativa mais analítica sobre a realidade do país. Nesta semana, o jornal El País e a Agência EFE já haviam revelado mensagens de líderes políticos europeus de apoio a Lula, preso na sede da Polícia Federal, em Curitiba, desde 7 de abril. Já nesta quinta-feira (17) o jornal francês Le Monde publicou artigo do ex-presidente Lula, com destaque na capa. 

No texto, Lula faz um balanço dos seus oito anos de governo, relembra sua luta política em defesa da democracia, volta a criticar a campanha difamatória contra ele e seu partido e explica porque quer voltar a ser presidente do Brasil. O Instituto Lula publicou em seu site a versão completa do artigo em português, que reproduzimos abaixo.

***

Porque eu quero voltar a ser presidente

Sou candidato a presidente do Brasil, nas eleições de outubro, porque não cometi nenhum crime e porque sei que posso fazer o país retomar o caminho da democracia e do desenvolvimento, em benefício do nosso povo. Depois de tudo que fiz como presidente da República, tenho certeza de que posso resgatar a credibilidade do governo, sem a qual não há crescimento econômico nem a defesa dos interesses nacionais. Sou candidato para devolver aos pobres e excluídos sua dignidade, a garantia de seus direitos e a esperança de uma vida melhor.

Na minha vida nada foi fácil, mas aprendi a não desistir. Quando comecei a fazer política, mais de 40 anos atrás, não havia eleições no País, não havia direito de organização sindical e política. Enfrentamos a ditadura e criamos o Partido dos Trabalhadores, acreditando no aprofundamento da via democrática. Perdi 3 eleições presidenciais antes de ser eleito em 2002. E provei, junto com o povo, que alguém de origem popular podia ser um bom presidente. Terminei meus mandatos com 87% de aprovação popular. É o que o atual presidente do Brasil, que não foi eleito, tem de rejeição hoje.

Nos oito anos que governei o Brasil, até 2010, tivemos a maior inclusão social da história, que teve continuidade no governo da companheira Dilma Rousseff. Tiramos 36 milhões de pessoas da miséria extrema e levamos mais de 40 milhões para a classe média.  Foi período de maior prestígio internacional do nosso país. Em 2009, Le Monde me indicou “homem do ano”. Recebi estas e outras homenagens, não como mérito pessoal, mas como reconhecimento à sociedade brasileira, que tinha se unido para a partir da inclusão social promover o crescimento econômico.

Sete anos depois de deixar a presidência e depois de uma campanha sistemática de difamação contra mim e meu partido,  que reuniu  a mais poderosa imprensa brasileira e setores do judiciário, o momento do país é outro: vivemos retrocessos democráticos, uma prolongada crise econômica, e a população mais pobre sofre, com a redução dos salários e da oferta de empregos, o aumento do custo de vida e o desmonte de programas sociais.

A cada dia mais e mais brasileiros rejeitam a agenda contra os direitos sociais do golpe parlamentar que abriu caminho para um programa neoliberal que havia perdido quatro eleições seguidas e que é incapaz de vencer nas urnas. Lidero, por ampla margem, as pesquisas de intenções de voto no Brasil porque os brasileiros sabem que o país pode ser melhor.

Lidero as pesquisas mesmo depois de ter sido preso em consequência de uma perseguição judicial que vasculhou a minha casa e dos meus filhos, minhas contas pessoais e do Instituto Lula, e não achou nenhuma prova ou crime contra mim. Um juiz notoriamente parcial me condenou a 12 anos de prisão por “atos indeterminados”. Alega, falsamente, que eu seria dono de um apartamento no qual nunca dormi, do qual nunca tive a propriedade, a posse, sequer as chaves. Para me prender, e tentar me impedir de disputar as eleições ou fazer campanha para o meu partido, tiveram que ignorar a letra expressa da constituição brasileira, em uma decisão provisória por apenas um voto de diferença entre 11 na Suprema Corte.

Mas meus problemas são pequenos perto do que sofre a população brasileira. Para tirarem o PT do poder após as eleições de 2014, não hesitaram em sabotar a economia com decisões irresponsáveis no Congresso Nacional e uma campanha de desmoralização do governo na imprensa. Em dezembro de 2014 o desemprego no Brasil era 4,7%. Hoje está em 13,1%.

A pobreza tem aumentado, a fome voltou a rondar os lares e as portas das universidades estão voltando a se fechar para os filhos da classe trabalhadora. Os investimentos em pesquisa desabaram.

O Brasil precisa reconquistar a sua soberania e os interesses nacionais. Em nosso governo, o País liderou os esforços da agenda ambiental e de combate à fome, foi convidado para todos os encontros do G-8, ajudou a articular o G-20, participou da criação dos BRICS, reunindo Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, e da Unasul, a União dos países da América do Sul. Hoje o Brasil tornou-se um pária em política externa, que os líderes internacionais evitam visitar, e a América do Sul se fragmenta, com crises regionais cada vez mais graves e menos instrumentos diplomáticos de diálogo entre os países.

Mesmo a parte da população que apoiou a queda da presidenta Dilma Rousseff, após intensa campanha das Organizações Globo, que monopolizam a comunicação no Brasil, já percebeu que o golpe não era contra o PT. Era contra a ascensão social dos mais pobres e os direitos dos trabalhadores. Era contra o próprio Brasil.

Tenho 40 anos de vida pública. Comecei no movimento sindical. Fundei um partido político com companheiros de todo o nosso país e lutamos, junto com outras forças políticas na década de 1980, por uma Constituição democrática. Candidato a presidente, prometi, lutei e cumpri a promessa de que todo o brasileiro teria direito a três refeições por dia, para não passar fome que passei quando criança.

Governei uma das maiores economias do mundo e não aceitei pressões para apoiar a Guerra do Iraque e outras ações militares. Deixei claro que minha guerra era contra a fome e a miséria. Não submeti meu país aos interesses estrangeiros em nossas riquezas naturais.

Voltei depois do governo para o mesmo apartamento do qual saí, a menos de 1 quilômetro do Sindicato dos Metalúrgicos do da cidade de São Bernardo do Campo, onde iniciei minha vida política. Tenho honra e não irei, jamais, fazer concessões na minha luta por inocência e pela manutenção dos meus direitos políticos. Como presidente, promovi por todos os meios o combate à corrupção e não aceito que me imputem esse tipo de crime por meio de uma farsa judicial.

As eleições de outubro, que vão escolher um novo presidente, um novo congresso nacional e governadores de estado, são a chance do Brasil debater seus problemas e definir seu futuro de forma democrática, no voto, como uma nação civilizada. Mas elas só serão democráticas se todas as forças políticas puderem participar de forma livre e justa.

Eu já fui presidente e não estava nos meus planos voltar a me candidatar. Mas diante do desastre que se abate sobre  povo brasileiro, minha candidatura é uma proposta de reencontro do Brasil com o caminho de inclusão social, diálogo democrático, soberania nacional e crescimento econômico, para a construção de um país mais justo e solidário, que volte a ser uma referência no diálogo mundial em favor da paz e da cooperação entre os povos.

Artigo originalmente publicado pelo jornal francês Le Monde. Acesse a versão original.

Nenhum comentário