Dormir para esquecer a fome
Mães
relatam suas lutas para criar os filhos em meio à pobreza, ao desemprego e aos
confrontos diários entre facções de traficantes, na Baixada Fluminense.
A fome dá sono. A fome deixa traumas nas vítimas para o resto da vida. E, em muitas famílias pobres da periferia do Rio de Janeiro, a fome atravessa gerações.
Pastoral é fonte de alimentação para moradores da Baixada
Suelen mora só com os cinco filhos; eles perderam o benefício do Bolsa Família depois que uma enchente levou documentos. Foto: Ana Lúcia Araújo/Agência Pública |
A fome dá sono. A fome deixa traumas nas vítimas para o resto da vida. E, em muitas famílias pobres da periferia do Rio de Janeiro, a fome atravessa gerações.
A fome é descrita por algumas mães como uma dor física
que atinge o estômago como um soco. Para outras, ela é acompanhada de um
sofrimento emocional imensurável quando não conseguem alimentar adequadamente
os filhos pequenos ou têm de enganá-los com alguma coisa que não seja comida de
verdade. Quando o alimento é insuficiente em casa, a mãe deixa de comer para
alimentar os pequenos.
Essas histórias das mulheres chefes de família para
alimentar e criar os filhos estão a apenas 80 quilômetros do centro do Rio de
Janeiro, no segundo estado mais rico do país, no município de Japeri, onde há
bolsões de pobreza e de fome. O município tem o pior Índice de Desenvolvimento
Humano (IDH) da região metropolitana.
A miséria é agravada pela violência e pelo desemprego.
Três facções de tráfico de drogas – Amigos dos Amigos, Comando Vermelho e
Terceiro Comando – disputam o controle de territórios, o que dificulta a
circulação e a busca por emprego. Os jornalistas que chegam ao município são
aconselhados a circular com as janelas do carro abertas e com o pisca alerta
ligado para que os bandidos não os confundam com a polícia ou com integrantes
de facções rivais.
Por causa dessa violência, dois dos sete Centros de
Assistência Social (Cras) da prefeitura ficaram fechados no segundo semestre de
2018. Os tiroteios ocorrem a qualquer hora do dia ou da noite e nenhum bairro
de Japeri é considerado seguro. Nem mesmo Engenheiro Pedreira, distrito que
concentra a maior parte da população, do comércio e dos serviços bancários.
Com uma população de 103 mil habitantes estimada pelo
IBGE, Japeri tinha 10.323 beneficiários do programa Bolsa Família em dezembro
de 2018. Nossa reportagem localizou mulheres em situação de extrema pobreza que
hoje não recebem o benefício por falta de documentos, ou que tiveram o
pagamento bloqueado.
Segundo o secretário de Ação Social do município, Márcio
Rosa, o governo federal suspendeu cerca de 6 mil benefícios em 2018 porque as
famílias não atenderam aos requisitos exigidos – como recadastramento e pesagem
das crianças – ou por divergência de informações sobre o rendimento familiar
apontada pelo cruzamento dos dados oficiais.
Cadastramento
itinerante
O secretário considera que o número de assistidos é muito
pequeno diante da pobreza visível nas ruas. Por isso, ele decidiu montar um
sistema itinerante para cadastrar a população carente que está fora do
programa. “Acreditamos que muitos não se inscrevem por desinformação, medo, ou
falta de dinheiro para se deslocar até a prefeitura”, disse Márcio Rosa.
Segundo ele, a prefeitura alugará um ônibus para percorrer bairros pobres e
fazer o cadastramento.
Os beneficiários do Bolsa Família, considerados
extremamente pobres, recebem um piso mensal de R$ 89,00. O valor é acrescido de
R$ 41 por criança (máximo de cinco, de 0 a 15 anos), de R$ 48 por jovem (de 16
a 17 anos, limitado a dois). Para manter o benefício nas famílias com filhos, é
preciso comprovar vacinação, pesagem e medição das crianças até 6 anos.
A ajuda da prefeitura de Japeri para amenizar a fome é
mínima. A secretaria distribui apenas 600 cestas básicas por ano. O número,
esclarece o secretário, refere-se à quantidade de unidades distribuídas, e não
de famílias atendidas. Ou seja, o atendimento não alcança todas as famílias em
situação de extrema pobreza.
Por causa da violência, a prefeitura suspendeu eventos
públicos para vacinação, corte de cabelo e serviços à população. “Como vamos
colocar funcionários públicos e a população na rua com três facções brigando
entre si?”, indagou o secretário. No início da entrevista, ele mostrou no
celular áudios de tiroteios gravados naquela manhã e na véspera.
Há
gerações, o sono funciona para escapar da fome
Dormir é um dos artifícios para ludibriar o estômago
vazio, diz Sônia Regina Campos, de 61 anos, ao relatar sua história. Nascida no
município vizinho de Mesquita, na Baixada Fluminense, ela tem dez filhos e 14
netos. Abandonou os estudos no terceiro ano do ensino fundamental, como
aconteceu com a mãe dela.
As semelhanças com a mãe vão além: ambas tiveram dez
filhos que não conseguiram alimentar adequadamente. O pai dela, alcoólatra,
teve vários ofícios. “Lembro dos dias sem comida na casa de meus pais. Minha
mãe punha a gente pra dormir para a fome passar, porque a fome dá sonolência.
Isso durou até eu ficar grande. Aos 14 anos, fui morar com minha avó, porque
faltava comida na casa da minha mãe”, disse.
Sônia Regina Campos: “Muitas vezes coloquei meus filhos para dormir para esquecer a fome, como minha mãe fazia”. Foto: Ana Lúcia Araújo/Agência Pública |
Sônia se casou aos 19 anos, contra a vontade da avó, e
repetiu o drama vivido pela mãe. O marido vivia de biscates e frequentemente
ficava sem trabalho. Ela fazia faxinas para colocar alguma comida na mesa. Mas
era insuficiente. “Muitas vezes coloquei meus filhos para dormir para esquecer
a fome, como minha mãe fazia.”
Ela lembra que o marido ficava nervoso quando estava
desempregado e não havia o que comer, e descarregava a ira espancando-a. “Eu
tentava consolar ele, mas ele me batia muito, muito. Batia como se estivesse dando
em um homem. Até grávida eu apanhava. Tive meu primeiro filho aos 20 anos. Aos
30, já tinha seis.”
Para alimentar os filhos, Sônia catava sobras de legumes
nas feiras e alimentos fora da validade descartados pelos supermercados.
“Graças a Deus, meus filhos nunca adoeceram por causa disso.” Ficou viúva aos
53 anos e, como o marido não deixou pensão, passou a sobreviver de faxinas e de
R$ 127 por mês que recebe do Bolsa Família.
Hoje, Sônia mora de aluguel em um pequeno cômodo no
bairro de Engenheiro Pedreira e divide o espaço com o filho mais novo. Ela
dorme na cama de solteiro e o filho, no chão. Não há geladeira nem armário na
casa. Há um velho televisor analógico de 14 polegadas e um rádio de pilha.
Suas filhas também têm dificuldade para alimentar os
filhos. Uma mora em um cômodo vizinho ao da mãe, com três crianças. Também
sobrevive do Bolsa Família e de doações dos vizinhos. Sônia diz que acompanha
angustiada a situação da filha e dos três netos pequenos. “Sei que passam fome
lá, porque ela vem me pedir comida. Mas posso ajudar pouco, porque também
dependo dos vizinhos.”
Pesagem do Bolsa Família no posto de saúde em Japeri. Foto:
Ana Lúcia Araújo/Agência Pública
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Angu
com mato
O faminto transforma mato em alimento, como relata Fátima
Regina dos Santos, de 53 anos, que nasceu e se criou na pobreza, na Baixada
Fluminense: “Alimentei meus filhos com maxixe e maracujá do mato, com banana
verde, angu com mato [capim] e com talo [haste] de pena de galinha assado no
fogão a lenha. Passei e ainda passo muita fome. Tem dia que eu queria comer um
pão, e não posso”.
Fátima não tem boas lembranças da infância. Contou que a
mãe era alcóolatra e se prostituía: “Minha infância foi muito ruim. Passei fome
e vestia roupas de saco”, afirmou. Ela teve seis filhos de dois maridos que não
a ajudaram no sustento das crianças. Sobrevive com o dinheiro de faxinas ocasionais,
com R$ 320 mensais que recebe do Bolsa Família e com a ajuda de vizinhos que às
vezes lhe dão “uma pontinha de carne”.
Ela mora em uma casa abandonada em uma favela dominada
pelo tráfico de drogas do bairro São Jorge, cujos proprietários fugiram para
escapar da violência. Vive em companhia de uma neta e da filha mais nova, de 14
anos. Contou que outra filha também mora em casa abandonada na mesma favela e,
assim como ela, cria filhos sem a ajuda dos pais e passa fome com frequência.
Comida
de presídio
Quem vê Luzia Jesus Mendonça caminhando pelas ruas do
bairro Jardim Belo Horizonte, em Japeri, não imagina a dramática situação em
que se encontra. Aos 41 anos, sofre de depressão e não possui nenhuma fonte de
renda, exceto alguns trocados que obtém com a venda de chinelos e perfumes para
vizinhos quase tão pobres quanto ela.
Tem quatro filhos e vive com dois deles e com um
companheiro em uma construção inacabada cercada por um matagal, na margem da
linha do trem. Do outro lado dos trilhos ficam os presídios onde a família
busca diariamente os pães para o café da manhã e as sobras das refeições da
guarda.
O filho menor, de 10 anos, é quem busca o pão. Entre 7h e
8h, o menino desce do morro por uma trilha estreita e escorregadia, atravessa a
linha do trem, passa pela Escola Municipal Belo Horizonte, onde estuda, e sobe
a ladeira até a entrada da Casa de Custódia Cotrim Melo, que faz parte do
complexo penitenciário de Japeri, incluindo os presídios Milton Dias e João
Carlos da Silva.
Segundo Luzia, nem todos os guardas comem a refeição que
é servida. Na maioria das vezes, o garoto volta para casa com pães e manteiga,
mas há dias em que leva também guaraná ou achocolatado.
O garoto almoça na escola e por isso à tarde cabe a ela
ir ao presídio esperar pelas marmitas recusadas pela guarda, que são
distribuídas por volta das 14h. Muitas famílias, segundo ela, matam a fome com
a comida do presídio. A marmita – com arroz, feijão, macarrão, farofa e carne –
é dividida para o almoço e o jantar da família.
Ela vive sob medicamentos antidepressivos. “Morei na
favela do Jacaré [no Rio de Janeiro] quando menina. Vi muitas mortes, muitos
tiroteios e fiquei com a cabeça ruim”, resumiu. A família recebe ajuda dos
fiéis do templo da Igreja Assembleia de Deus, que ela frequenta. “Tenho ajuda
da igreja e do presídio. É lá e cá”, resume.
Excluídas
do Bolsa Família
Luzia Mendonça, que depende da comida do presídio para
sobreviver, está entre os 6 mil que tiveram o Bolsa Família suspenso. Desde
julho, quando o filho de 15 anos foi morar com o pai e abandonou a escola, ela
deixou de receber o benefício. A manutenção do pagamento exige frequência
escolar mínima de 85% até os 15 anos e de 75% dos 16 aos 17 anos. Com a
ausência da sala de aula, veio a perda da ajuda.
Já Luciene da Costa Lima e seus quatro filhos foram
suspensos do programa Bolsa Família em setembro de 2018. Segundo ela, o governo
bloqueou o pagamento mensal de R$ 525 que recebiam porque o cruzamento dos
dados de renda mostrou que a filha menor, de 3 anos, passou a receber pensão do
INSS de um salário mínimo em razão da morte do pai, em um acidente de trem.
Sob a ótica fria dos números, a pensão de R$ 950 que a
menina passou a receber tirou a família da situação de extrema pobreza. Mas a
realidade é outra. Com a pensão da menina, Luciene paga o aluguel da casa, de
R$ 250 mensais, e corre para o supermercado para garantir a compra do mês: 35
quilos de arroz, 8 quilos de feijão, oito latas de óleo, 20 quilos de açúcar,
sete caixas de leite e bastante fubá para o angu. Não compra café por economia.
A carne entra eventualmente no cardápio, mas só as partes menos nobres da
galinha, que são mais baratas. “As crianças pedem um iogurte, mas não posso
dar”, diz.
A casa é minúscula – sala, quarto e cozinha –, mas os
cômodos são limpos e enfeitados com os brinquedos das crianças doados por
igrejas. Luciene é analfabeta. Abandonou a escola no segundo ano do ensino
fundamental e só sabe desenhar as letras do próprio nome.
Resignação
e luta
Aos 29 anos, Joice Aparecida dos Santos Ferreira
desdobra-se para criar seis filhos. Os dois mais velhos são pré-adolescentes e
a mais nova tem 1 ano. Todas as crianças têm nomes iniciados com K: Kauã, Kaio,
Kaíque, Karen, Kailane e Kauane.
Todos são filhos do auxiliar de pedreiro Agnaldo Orlando
Silva. Sem emprego fixo, ele vive de “bicos”. O casal separou-se e ela precisou
ir à Justiça para obrigá-lo a ajudar no sustento dos filhos. Mas a jovem
mostra-se resignada com suas duras condições de vida. Não se queixa do
ex-marido omisso e elogia uma tia dele, empregada doméstica em Copacabana, que
a ajuda com dinheiro e mantimentos.
Joice vive com as crianças em um “puxadinho” de dois
cômodos nos fundos da casa da avó, Maria Ernestina Santos, de 70 anos,
ex-empregada doméstica que se alfabetizou depois de aposentada. A avó diz que
sofre ao ver as dificuldades da neta. “Ela não me pede nada, mas sei que passa
muita dificuldade. Eu a ajudo disfarçadamente, pra não deixá-la com vergonha.”
Os filhos maiores de Joice estudam na Escola Espírita
Joanna de Angelis, onde tomam o café da manhã, almoçam e fazem o lanche da
tarde. Os menores estão em uma creche municipal, onde também almoçam. A casa em
que vivem não tem guarda-roupas, geladeira, mesa nem cadeiras. Apenas uma cama
de casal e uma de solteiro, um velho armário e um fogão na cozinha. A única
distração na casa é uma pequena TV analógica de 14 polegadas.
Para sustentar os filhos, Joice se desdobra: faz três
faxinas por semana e borda vestidos e bermudas em casa, enquanto os filhos
estão na escola ou dormindo. Ela presta serviços a uma costureira que paga R$ 2
por short bordado. O pastor da igreja que ela frequenta é feirante e costuma
lhe dar verduras.
Ela não imaginava assim seu futuro: “Pensava que seria
muito melhor, mas farei tudo o que puder para que meus filhos tenham uma
situação melhor que a minha”.
Moradores
de Japeri recebem ajuda de religiosos
Na Vila Santa Amélia, um dos bairros mais desassistidos
de Japeri, a Instituição Espírita Joanna de Angelis mantém uma escola com 125
alunos em horário integral. Fundada em 1980 pela alagoana Terezinha Oliveira
Lopes, de 86 anos, é um projeto liderado por mulheres. As mães dos alunos
dedicam um dia do mês para ajudar na cozinha, limpar e cuidar das instalações.
As salas são arejadas e enfeitadas com flores e cortinas coloridas. Árvores
frutíferas dão sombra que amenizam a temperatura. O amplo refeitório é usado
pelos moradores para festas de casamento e aniversários.
A fundadora nasceu em uma família de 20 filhos. Eram
pobres, mas nunca passaram fome. “Se não fosse a comida daqui, muitos passariam
fome”, conta Terezinha.
Os alunos recebem uniforme e material escolar e têm café
da manhã, almoço e lanche da tarde. Além das matérias curriculares, aprendem
música, informática e costura. Os custos são bancados por integrantes do Centro
Espírita Joanna de Angelis, de Copacabana, e por amigos da fundadora. As famílias
dos alunos contribuem com 1 quilo de alimento por mês.
Terezinha é professora aposentada e mora em Botafogo, na
zona sul do Rio de Janeiro, cerca de 100 quilômetros de distância dali. Apesar
da idade avançada, enfrenta o calor e os engarrafamentos e vai todos os dias
úteis a Japeri. “Nunca fui assaltada nem abordada por traficantes. Tampouco
recebi ordem de toque de recolher na escola. Sou respeitada por meu trabalho”,
diz.
Ela atribui às entidades espíritas a decisão de construir
a escola. Tinha recebido dois lotes em herança e foi até lá com a intenção de
vendê-los. Ao ver que não havia nenhuma escola na região, comprou mais dois
lotes. “Esta é minha fonte de energia e minha razão de vida”, resume.
Pastoral é fonte de alimentação para moradores da Baixada
Toda primeira semana de mês, o pátio da igreja católica
Sagrada Família, no bairro da Posse, município de Nova Iguaçu, também na
Baixada Fluminense, é tomado pela algazarra de cerca de 50 crianças que são
levadas pelas mães para serem medidas e pesadas. Ao final, recebem suplementos
alimentares e roupas doadas por fiéis. A equipe da Pastoral da Criança,
entidade da Igreja Católica, conhece as necessidades de cada mãe e faz o
acompanhamento permanente das mais necessitadas.
É o caso de Suelen Paulino de Assis, de 24 anos, que teve
o quinto filho três dias antes do réveillon, uma menina, registrada como
Alícia. Ela mora só com os filhos em uma casa abaixo do nível da rua. Quando
chove, a água cobre os poucos móveis e o fogão. Mãe e filhos trazem manchas de
escabiose, um tipo de sarna transmitida por cachorros. Eles perderam o
benefício do Bolsa Família em 2017 porque as certidões de nascimento e as
carteiras de vacinação foram levadas pela enchente e não providenciaram novos
documentos.
A história de Suelen é igual à de muitas outras jovens
pobres da Baixada Fluminense. Os cinco filhos são de quatro pais diferentes.
Ela os cria sozinha, sem ajuda financeira de nenhum deles. Engravidou dos
namorados no início dos relacionamentos e foi mãe pela primeira vez aos 15
anos. Como consegue alimentar os seus filhos? “Com a ajuda dos outros, dou
arroz e feijão. Às vezes, as pessoas me dão um litro de leite”, conta. Verduras
e legumes não fazem parte de nenhuma refeição das crianças.
Também atendidas pela Pastoral, Marcela da Cruz Barbosa,
de 25 anos, e Marcela Ferreira da Silva, de 36, vivem igualmente na extrema
pobreza. A primeira estudou até o quarto ano do ensino fundamental e mora com o
marido e três filhos em um barraco de tábua e piso de terra batida. A outra tem
cinco filhos e mora na beira de um valão, na periferia de Nova Iguaçu.
“Meu sonho é ter uma casa de tijolos. Mas sou caprichosa
e mantenho tudo limpo”, acrescenta, com orgulho, Marcela Barbosa. Ela faz
faxinas e o marido recebe R$ 216 por semana em um lava-jato. A renda do casal é
completada com R$ 350 do Bolsa Família. Eventualmente, os pais dormem com fome.
A outra Marcela é analfabeta, tal como a sua mãe, que
também mora na Baixada. “Sempre quis estudar e ser cuidadora de idosos, mas
minha mãe não deixou. Ela dizia: se eu não pude ir à escola, você também não
pode.”
Ela trabalhou como babá até o nascimento do segundo filho
e faz faxinas para completar os R$ 241 mensais que recebe do Bolsa Família. O
cardápio se limita a arroz com feijão, mas ela diz que não falta esse básico
para as crianças. “Sou supermãe. Meus filhos estão sempre em primeiro lugar na
minha vida.”
*Colaboraram
Angelina Nunes, Claudia Lima e Cristina Alves.
Este
texto é resultado do Concurso de Microbolsas de Reportagem Fome, realizado pela
Agência Pública em parceria com a Oxfam Brasil, e foi originalmente publicado em 13 de março de 2019. Confira as outras reportagens AQUI.
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