"Está queimando mais do que nunca", diz autor de foto símbolo da destruição da Amazônia
O fotógrafo Araquém Alcântara registra a
floresta desde os anos 1980 e diz estar revoltado com queimadas.
Por Juca
Guimarães - Brasil de Fato
24/08/2019
"A Amazônia sempre queimou, principalmente nos meses
secos de agosto e setembro, só que desta vez ela está queimando muito
mais", atesta o fotógrafo Araquém Alcântara, com 49 anos de jornalismo e
mais de 50 viagens e expedições à floresta amazônica na carreira. Ele acaba de
voltar de lá com registros da catástrofe ambiental gerada pelos incêndios dos últimos meses.
Tamanduá cego pelo fogo à beira da BR Cuiabá-Santarém. Ao sentir a presença do fotógrafo, defende-se. Foto: Araquém Alcântara |
"Estou cheio de revolta. É preciso elevar o
tom", declarou através das redes sociais, questionando, entre outros
temas, a postura do presidente Jair
Bolsonaro (PSL) de abrir mão dos recursos do Fundo Amazônia. "A
intensificação do desmatamento é real, é coisa objetiva feita por satélites. E
o cara diz que os dados não são reais, que não precisamos de dinheiro
estrangeiro. Desmatamento livre é o que quer", questionou.
As imagens chocantes feitas pelo fotógrafo sobre os
impactos das queimadas e do desmatamento na região Norte do Brasil, em especial
a do tamanduá-mirim fugindo do fogo, já cego, na beira da BR que liga
Cuiabá-Santarém, viralizaram nos últimos dias nas redes sociais com mensagens
de indignação.
A relação do fotógrafo com a maior floresta do mundo é de
quatro décadas. Em 2005, um dos quatro livros que fez sobre a Amazônia recebeu
o prêmio Jabuti de literatura. Ao todo, Araquém Alcântara já produziu 54
livros, mas o seu tema preferido é a Amazônia, onde afirma estar sua
"matriz criativa" e onde passa a maior parte do tempo.
As notícias dando conta das queimadas na região confirmam
a avaliação do fotógrafo sobre a degradação da natureza provocada pelo homem.
“Nunca foi tão alarmante".
Confira os melhores momentos da entrevista
exclusiva concedida por Araquém ao Brasil de Fato:
Quando você foi para a Amazônia pela primeira
vez?
Foi em 1980. De lá para cá, eu publiquei quatro livros,
fiz a primeira edição para colecionador da National Geographic, fui
o primeiro fotógrafo a documentar todos os parques nacionais da Amazônia. Eu
sou uma testemunha ocular da Amazônia.
E qual a sua visão dela hoje?
Vejo como um assunto muito além de qualquer partido, de
qualquer ideologia. É um assunto mundial, um assunto global. É uma questão de
sobrevivência da humanidade. Então o brasileiro tem que defender a maior
floresta da terra.
As queimadas, então, são um problema
político?
Não me interessa falar desse ou daquele governo. Entra
governo e sai governo e a Amazônia continua sendo dizimada fruto de nossa
ganância, do lucro fácil, da falta de patriotismo. Não é questão de um governo.
É de todos. Vem desde antes da ditadura. Todos são responsáveis por este estado
crítico da Amazônia.
O que você observou de mais impactante agora
na Amazônia?
Quando se destrói uma área muito grande, você está
acabando com os corredores ecológicos, com a fauna. Alguns bichos como a
harpia, o gavião real, o iraçu, a onça pintada, a jaguatirica, os felinos em
geral, precisam de áreas muito grandes e então [com o desmatamento que reduz o
tamanho da floresta] elas estão condenadas à extinção.
O que o mais o país perde com a degradação da
Amazônia?
O Brasil não conhece os benefícios e as riquezas da
Amazônia. Ela sequer foi estudada e a gente já tá extinguindo antes de
estudá-la.
As queimadas são um fenômeno atípico da
região?
A Amazônia sempre queimou, principalmente nos meses secos
de agosto e setembro, só que desta vez ela está queimando muito mais.
E quais são os efeitos disso?
A floresta já entrou em um estado de saturação, de
produzir menos chuvas. Isso vai afetar o clima na região Sudeste, vai afetar a
agricultura no Centro-Oeste. A gente já devia estar há muito tempo eliminando o
desmatamento. E, ao contrário, está aumentando mais. O Estado deveria
intervir.
Quais são os seus próximos projetos para este
material sobre a Amazônia?
Eu vou fazer um documentário, um livro e uma exposição
sobre a Amazônia. Estou completando cinquenta anos de carreira e daqui a um mês
vai sair um livro novo, o de número 55, chamado “Brasileiros”, que são retratos
de pessoas de várias regiões do Brasil.
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