Com perícia apressada e incompleta, MP não prova que ‘porteiro mentiu’ sobre Bolsonaro
Promotoras de Justiça – uma das quais bolsonarista militante - acusam porteiro de ter mentido com
base em perícia inconsistente e feita às pressas.
Por Crítica21 com informações da Folha de São Paulo, JN/TV Globo e dos jornalistas Luis Nassif e Leandro Demori
As promotoras de Justiça do MP-RJ Letícia Emili Alqueres
Petriz, Simone Sibílio e Carmen Eliza Bastos de Carvalho. Foto: Fernando
Frazão/Agência Brasil
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Por Crítica21 com informações da Folha de São Paulo, JN/TV Globo e dos jornalistas Luis Nassif e Leandro Demori
31/10/2019
Depois
das novas revelações do Caso Marielle feitas pelo Jornal Nacional, da TV Globo,
na última terça-feira (29), o Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) decidiu dar uma coletiva de imprensa. Nela, o órgão acusa o porteiro que relacionou Bolsonaro ao dia do crime de ter mentido. A entrevista ocorreu nesta quarta-feira (30).
As promotoras do caso disseram que
um dos acusados do crime teria ido até a casa de Ronnie Lessa (suspeito de ter efetuado
os disparos que mataram Marielle e Anderson), e não à casa de Bolsonaro. A
promotora Simone Sibílio disse que o MP fez perícia técnica que comprovaria que
o porteiro ligou para o próprio Lessa e não para o então deputado federal.
Mas
o jornal Folha de São Paulo, em reportagem publicada nesta quinta-feira (31),
mostra que a perícia feita pelo MP, além de ter sido feita às pressas, deixou
lacunas. O jornal ouviu especialistas segundo os quais a perícia não analisou
pontos importantes. A reportagem destaca que as promotoras não perguntaram aos
peritos se algum arquivo pode ter sido excluído ou renomeado. Segundo a Folha,
a perícia foi feita no mesmo dia da entrevista coletiva do MP e o setor técnico
não teve acesso ao computador de origem.
Perícia rápida
Conforme apuração do JN, as perguntas que constam no pedido de perícia foram protocoladas
às 13h05, e a coletiva anunciando as conclusões começou pouco depois, às 15h30.
À Folha, o presidente da Associação Brasileira de Criminalística, Leandro
Cerqueira, disse que, sem acesso à máquina em que os arquivos foram gravados,
não é possível identificar se um arquivo foi apagado ou renomeado. Destacou ainda
que o arquivo pode ter sido trocado e que seria necessário o acesso ao
equipamento original.
Já
a Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais afirmou ao jornal ser temerário
o possível arquivamento de uma notícia de fato sem o devido exame pericial
oficial. Segundo a Folha de São Paulo, o MP afirmou também não ser possível
confirmar nem mesmo se a gravação registrada na portaria é do mesmo porteiro
que prestou depoimento.
Em
resposta ao JN, o MP confirmou que o sistema de áudio da portaria e o
computador não foram apreendidos porque, a partir do momento em que houve a
citação da autoridade com foro, nenhuma outra medida de busca poderia ser
adotada. O MP informou que realizou a perícia no arquivo de áudio apreendido
porque Ronnie Lessa não possui foro de prerrogativa de função. O JN quis saber também
como os peritos conseguiram responder às perguntas das promotoras em menos de
três horas, já que havia três meses de conversas gravadas, mas o MP se limitou
a responder que estas informações estão no processo.
Promotora bolsonarista
Além
das inconsistências apontadas pela Folha, o jornalista Leandro Demori, do The
Intercept Brasil, divulgou prints do perfil privado de uma das promotoras que apontam apoio e militância em favor de Bolsonaro, além de
ojeriza à esquerda. Outros veículos de comunicação, como Veja e Estadão, também
repercutiram a notícia.
A promotora Cármem fez campanha para Bolsonaro em 2018, ano do assassinato de Marielle e Anderson. Foto: reprodução/Instagram |
Sobre a descoberta, o jornalista questiona: "Como será a atuação dessa promotora no caso do assassinato de uma pessoa que ela define como esquerdopata? Como será sua atuação em um caso que envolve Bolsonaro, aquele que está estampado em sua camisa?"
Nesta quinta-feira (31) o jornalista Luis Nassif trouxe elementos que também colocam em
dúvida a posição do MP. Nassif disse que recebeu de fonte fidedigna a
informação segundo a qual “o condomínio abriu mão de interfones, por ser caro e
por problemas de instalação. Optou-se por telefonar ou para o celular ou para o
telefone fixo de cada proprietário”.
Versão do porteiro não é descabida
O jornalista afirma que no caso do então
deputado, “as ligações são para o próprio celular de Bolsonaro. E é ele quem
atende. O que significa que a versão do porteiro não era descabida. Ou seja, o
fato de estar em Brasília não o impedia de atender o telefone.”
Nassif
diz que um dos filhos de Bolsonaro, Carlos (que mora no mesmo condomínio), também recebe os
recados pelo celular. “Em geral, fica pouco no condomínio, pois prefere
permanecer em seu apartamento na zona sul. Mas porteiros ouvidos por moradores
sustentam que, naquele dia, ele estava no condomínio.”
Segundo
a apuração do jornalista, o porteiro do depoimento está de férias. “Mas
moradores do condomínio foram, por conta própria, conversar com os demais
porteiros. E eles garantiram que a ligação foi feita para Bolsonaro mesmo.”
Com
base nessas informações, Nassif defende que o JN deveria recuperar a reportagem
e aprofundá-la, pois a de terça-feira não foi bem feita: “colocou porteiro e
porteiros à mercê de Sérgio Moro e Augusto Aras, que se transformaram no grande
braço de Jair Bolsonaro. Há tempo de se tentar salvar a reportagem”, concluiu.
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