Protestos e recuo do governo equilibram jogo político no Equador, acredita professor
Manifestações
populares contra medidas impostas pelo FMI tomaram o país durante 12 dias.
Por Brasil de Fato
16/10/2019
O
recuo do governo do Equador em relação ao decreto que aumentava o preço dos
combustíveis em 123% - o que resultou numa série de protestos - pode
significar um equilíbrio de forças na situação política do país, até então
mais favorável os grupos econômicos que apoiam a gestão neoliberal do
presidente Lenín Moreno. Os protestos, que duraram 12 dias, mostraram o
poder dos movimentos populares equatorianos, liderados sobretudo pela
Confederação de Nacionalidades Indígenas (Conaie).
Polícia equatoriana reprimiu manifestantes durante os protestos. Foto: reprodução/CIDH |
“Moreno
tem o apoio das Forças Armadas, da grande imprensa, do grande empresariado e do
FMI. Por outro lado, o grau de mobilização e resiliência demonstrado pelos
movimentos sociais mostra que temos, por ora, uma situação de empate. Nenhum
dos lados têm condições, neste momento, de impor uma derrota definitiva ao
outro. E isso pode perdurar nos próximos meses”, afirma Wagner Iglecias,
professor do Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina da
Universidade de São Paulo (Prolam-USP).
Para
Iglecias, a revogação do decreto deve reduzir a tensão política. "Mas os
movimentos indígenas têm forte grau de organização e não se pode descartar a
hipótese de que voltem a promover mobilizações, caso o governo não cumpra o que
foi acordado entre as partes”. Outra exigência dos movimentos, ainda não
atendida, é a demissão dos ministros da Defesa, Oswaldo Jarrín, e de Governo,
María Paula Romo.
Antes
dos protestos, além do fim dos subsídios, Moreno havia anunciado uma série
de outras medidas como parte de exigências feitas pelo Fundo Monetário
Internacional (FMI). Entre elas, as reformas trabalhista e
previdenciária. Devido à intensidade das manifestações, Iglecias acredita
que o presidente equatoriano deve adotar medidas menos impopulares a
partir de agora.
Repressão
Uma
série de opositores ao governo foram presos mesmo após o acordo, dando
continuidade à forte repressão que marcou os 12 dias de protesto, iniciados em
3 de outubro e encerrados somente no dia 14.
Entre
as detenções recentes está a da governadora da província de Pichincha,
Paola Pabón, uma das lideranças da chamada Revolução Cidadã. Ela foi presa
nesta segunda-feira (14) sobre a acusação de “rebelião”. Christian Gonzáles e
Pablo Correa, dois militantes da organização Bulla Zurda, foram presos sob a
mesma acusação.
Para
o economista equatoriano Danilo Albán, a perseguição a opositores, ainda em
curso, representa uma tentativa de manter a popularidade que Moreno possui nos
setores mais à direita do país. “O
presidente agora sabe que seu governo ficou muito fraco […] Ele vai fazer uma
caça às bruxas contra seus inimigos políticos. Isso fortalece sua pouca
popularidade”, diz.
Ao
todo, segundo dados divulgados nesta quarta-feira (15) pela Defensoria Pública,
instituição nacional que monitora a situação dos direitos humanos no Equador,
1.192 pessoas foram presas. Muitas não tiveram acusações formais apresentadas.
Além disso, 8 morreram e 1.340 ficaram feridas.
Manifestações
Em
1º de outubro, para dar seguimento ao pagamento do déficit público equatoriano,
acentuado nos últimos anos, Moreno anunciou uma série de reformas trabalhistas
e fiscais, entre elas o fim de subsídios estatais aos combustíveis. O corte no
auxílio, em vigor no país há 40 anos, foi a medida que mais desagradou a
população.
A
diligência foi tomada como parte das imposições feitas pelo FMI, órgão que
fechou um empréstimo na ordem de US$ 4,2 bilhões com o Equador em fevereiro
deste ano. O pacote de recuperação econômica inclui ainda outros US$ 6 bilhões
vindos de organismos multilaterais.
As mobilizações que atingiram o país começaram no dia 3, data em que o fim dos
subsídios passou a valer. De imediato, motoristas de ônibus, táxis e caminhões
bloquearam as principais ruas da capital, Quito, e de Guayaquil. Por conta
disso, as aulas foram suspensas.
Estudantes
universitários, sindicatos e indígenas também aderiram aos protestos, que
passaram a ocorrer em toda a nação. Entre os grupos, participa a Confederação
de Nacionalidades Indígenas do Equador (Conaie), uma das principais lideranças
dos protestos.
O
maior ato ocorreu na quarta-feira (9), dia marcado por uma greve geral e duas
concentrações em Quito. Sabendo que a capital seria o local onde a maior parte
das manifestações iria ocorrer, Moreno anunciou a transferência da sede do
governo de Quito para Guayaquil.
Em
resposta às manifestações, o presidente decretou, já em 3 de outubro, estado de
exceção. A medida permitiu que o governo limitasse o ir e vir da população e
passasse a impor censura prévia à imprensa. O estado de exceção parou de valer
na segunda.
Edição:
João Paulo Soares – Brasil de Fato
Nenhum comentário