Covid-19: estudo expõe riscos da cloroquina e pesquisadores são atacados
Informações preliminares apontam danos no uso
de doses altas e não permitem concluir que a medicação em doses baixas funciona
ou não contra a doença gerada pelo novo coronavírus.
Por Crítica21
17/04/2020
Dados preliminares da pesquisa CloroCOVID-19 foram divulgados
no último sábado (11), na Plataforma Brasil. As informações foram publicadas também no site MedRxiv, de alcance internacional. A intenção, segundo nota dos autores do estudo, “foi advertir demais pesquisadores do mundo sobre a
toxicidade de uma dose alta, que apesar de teoricamente parecer mais eficaz,
estava causando mais danos do que benefícios”.
Os resultados preliminares foram publicados no site MedRxiv, de alcance internacional. Foto: reprodução |
Submetido à Comissão Nacional de Ética em Pesquisa
(CONEP) em 20 de março, o CloroCOVID-19 foi aprovado três dias depois. Conforme
os pesquisadores, “todos os pacientes e/ou familiares foram orientados sobre o objetivo do estudo e assinaram Termos de Consentimento Livre e Esclarecido”. Na pesquisa, foram ministradas doses baixas para um grupo de pacientes e doses altas para
outro grupo. Foram incluídos apenas pacientes graves com síndrome
respiratória aguda grave, com suspeita (e posterior confirmação laboratorial)
de Covid-19.
De acordo com os autores da pesquisa, “o estudo pretende ainda
verificar se há ação benéfica da cloroquina, em comparação com dados de outros
estudos internacionais, nos quais pacientes em condições clínicas semelhantes
não usaram cloroquina.”
Inicialmente, a pesquisa previu a inclusão de 440
pacientes hospitalizados em estado grave, no Hospital Delphina Aziz, referência
para a Covid-19 no Amazonas. Segunda a nota dos pesquisadores, um comitê que
acompanha o estudo solicitou a análise dos dados, depois que ocorreram as
primeiras mortes de pacientes incluídos na pesquisa.
Até a data da análise, 11 pessoas haviam morrido por Covid-19,
sendo a maioria idosos - mesmo perfil de pacientes graves em todo o mundo. O estudo
verificou, naquele momento, “que havia tendência de mais efeitos colaterais nos
pacientes em uso da maior dose”. A alta dose foi suspensa e todos os
participantes passaram a usar a dose mais baixa, em 6 de abril.
Nesta fase da pesquisa, a primeira conclusão foi “que
pacientes graves com Covid-19 não deveriam mais usar a dose recomendada no
consenso chinês, fato que até o momento não se tinha qualquer evidência, uma
vez que nenhum estudo realizou adequadamente a avaliação de segurança, como
eletrocardiogramas diários, como feito em Manaus/AM, sob assessoria de
cardiologistas experientes e renomados.”
Os pesquisadores perceberam que “dose altas parecem ser
seguras em pacientes com câncer, mas não em pacientes graves com Covid-19, em
especial os mais idosos.” Também verificaram que “o estudo não permite em
absoluto concluir que a cloroquina em doses baixas funciona ou não para a Covid-19,
porque não tem o grupo comparador de controle, ou seja, sem usar a medicação. Outros
estudos para responder a essa questão, estão sendo realizados nesse momento, em
outras partes do planeta.”
Ataques
Veículos de comunicação como o New York Times e a CNN
deram ampla cobertura aos resultados preliminares, com repercussão importante
nos EUA. Mas esses resultados geraram, também, ataques de apoiadores dos presidentes
Donald Trump (EUA) e Jair Bolsonaro (Brasil) aos pesquisadores envolvidos na
CloroCOVID-19. Os líderes políticos são ferrenhos defensores do uso da cloroquina
para pacientes com o novo coronavírus.
Uma das primeiras reações foi do investidor e CEO da Yuko
Social, Michael Coudrey, responsável por controle de mídia para políticos e
organizações. Ele publicou no Twitter, em 14 de abril, que ‘o estudo brasileiro
era irresponsável e que tínhamos usado os pacientes como cobaias humanas’.
A mensagem viralizou e foi amplamente divulgada no Brasil
em sites e mídias sociais de apoio a Bolsonaro. Com a repercussão, os autores
da pesquisa foram alvo de manifestações violentas e ataques de natureza
ideológica.
Em nota, os pesquisadores destacaram que a interpretação
equivocada de Coudrey e seus seguidores foi de que todas as mortes ocorridas no
estudo se deveram ao uso das altas doses, mas “nem todos os pacientes usaram a
alta dose e todos eles tinham Covid-19 muito grave, vindo a falecer por conta
da doença, o que ocorreu dentro da média mundial.”
Fiocruz divulga nota
O CloroCOVID-19 reúne mais de 70 profissionais, entre
pesquisadores, estudantes de pós-graduação e colaboradores de instituições com
tradição em pesquisa, como a Fiocruz, Fundação de Medicina Tropical Dr. Heitor
Vieira Dourado, Universidade do Estado do Amazonas e Universidade de São Paulo.
Nesta sexta-feira (17), o Conselho Deliberativo Fiocruz
divulgou nota em apoio aos pesquisadores responsáveis pelo estudo. “A
instituição considera inaceitáveis os ataques que alguns de seus pesquisadores
vêm sofrendo nas redes sociais, após a divulgação de resultados preliminares
com o uso da cloroquina em pacientes graves com a Covid-19”.
A Fiocruz ressaltou que “apoia incondicionalmente seu
corpo de pesquisadores, que estão absolutamente comprometidos com a ciência e
com a busca de soluções para o enfrentamento dessa pandemia, e reafirma seu
compromisso com a missão de produzir, disseminar e compartilhar conhecimentos e
tecnologias voltados para o fortalecimento e a consolidação do Sistema Único de
Saúde (SUS) e para a promoção da saúde e da qualidade de vida da população
brasileira.”
Edição: Anderson Augusto de Zottis Soares – Crítica21
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