Por 4 a 1, STF confirma acesso de Lula a mensagens que mostram trapaças da Lava Jato
Até a ministra Cármen Lúcia, antes afinada aos lavajatistas, votou a favor da defesa do ex-presidente; com a decisão, o ex-juiz Sergio Moro fica mais perto da suspeição nos processos contra o petista.
Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Cármen Lúcia e Nunes Marques rejeitaram petição dos procuradores da Lava Jato. Fotos: Nelson Jr. (RL e GM), Rosinei Coutinho (CL) e Fellipe Sampaio (NM)/SCO/STF |
Depois de anos agindo como mafiosos nos porões do Telegram, o ex-juiz Sergio Moro e os procuradores da operação Lava Jato tentam impedir que venham à tona as trapaças de que eles foram protagonistas. E nesta terça-feira (9) os falsos heróis tiveram mais uma derrota. A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), por 4 a 1, manteve a liminar que deu à defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva acesso às mensagens trocadas entre Moro e os procuradores de Curitiba.
A liminar foi concedida pelo ministro Ricardo Lewandowski na Reclamação (RCL) 43007. Votaram a favor do compartilhamento o próprio Lewandowski (relator), Nunes Marques, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes. Edson Fachin divergiu. Os diálogos foram obtidos por hackers e foram periciados pela Polícia Federal no âmbito da Operação Spoofing.
Com a decisão, que mantém o compartilhamento das mensagens, o ex-juiz Sergio Moro deve ser considerado suspeito em julgamento ainda sem data marcada, mas previsto para ocorrer neste semestre. Os processos que ele conduziu na 13ª Vara Federal de Curitiba poderão ser anulados, como os casos do triplex do Guarujá e do sítio de Atibaia, manipulados para tirar Lula das eleições de 2018 e comprometer a atividade política do ex-presidente.
O
voto de Lewandowski
Ao citar a argumentação do advogado de Lula, Cristiano Zanin Martins, Lewandowski destacou que a Lava Jato negou acesso da defesa ao material usado pela força-tarefa, utilizado na denúncia, com prejuízo à defesa. O ministro rejeitou a argumentação dos procuradores de que as conversas expõem a vida privada dos interlocutores, argumento acatado por Fachin.
“O material se refere a conciliábulos entre agentes estatais concernentes a serviços públicos”, disse Lewandowski. Ele ressaltou que as conversas relativas a serviço público se deram em celulares mantidos pelo Estado. Neste caso, não há argumento plausível de que o sigilo foi violado. “Concordo que o que veio à tona é extremamente grave e causa perplexidade”, afirmou.
O relator destacou que os procuradores insistiram sucessivamente no descumprimento de decisões anteriores do STF e dele próprio, que determinaram o acesso da defesa de Lula ao acordo de leniência e às tratativas internacionais, numa “recalcitrância incompreensível”. (Leia a íntegra do voto do ministro Ricardo Lewandowski)
O
voto de Nunes Marques
O mais novo ministro da corte, Nunes Marques, votou com o relator, mas se ateve mais a detalhes técnicos. "Entendo inexistir legitimidade processual aos peticionantes [procuradores] na medida em que atuam em nome próprio em interesse alheio. Ainda que se busque defesa de interesses institucionais, é de competência exclusiva do procurador-geral da República", fundamentou.
O
voto de Cármen Lúcia
No julgamento desta tarde, Cármen contestou a argumentação da subprocuradora Claudia Lima Marques, segundo a qual seria “inusitado” que a privacidade de terceiros (familiares, por exemplo) seja afetada pela divulgação das mensagens. “Também acho inusitado que terceiros venham a esta altura entrar no caso”, disse a ministra. “A polícia tem acesso aos dados; o Ministério Público tem acesso aos dados; o juiz tem acesso aos dados; e a defesa não tem acesso aos dados?”, acrescentou Cármen, a favor de Lula.
O
voto de Gilmar Mendes
Em seu voto, o ministro Gilmar Mendes teceu duras críticas aos métodos da Lava Jato e questionou a suposição da falta de legitimidade das mensagens. "Será obra de ficção isso? Foi adulterado em que ponto? Vamos admitir que seja uma obra de ficção. Então que se prove que esses diálogos nunca existiram", argumentou durante seu voto. “Ou os hackers merecem o Nobel de Literatura, ou as mensagens são verdadeiras”, ponderou.
O ministro leu muitas mensagens do material e fez referência às citações ao apelido de Moro nas conversas. O ex-juiz era chamado de Russo pelos procuradores da força-tarefa. "O Russo, que é o Moro, criou seu próprio código de processo penal da Rússia", afirmou.
"Portanto, eles estavam fazendo um Código de Processo Penal. E não era de Curitiba: era da Rússia", afirmou o ministro. "Isso envergonha os sistemas totalitários. É disso que nós estamos a falar. A não ser que se prove que isso não existiu, que é obra de um ficcionista", complementou. Gilmar continuou: "Eu quero que alguém diga honestamente que isso encontra abrigo na Constituição. É chocante. É constrangedor."
Segundo Gilmar Mendes, "esse modelo de Estado totalitário teve a complacência da mídia". "Agora já não é o julgamento de um caso. Nós fomos cúmplices. Tortura feita por esta gente bonita de Curitiba. Os fatos são tão graves que estão repercutindo mundo afora."
O
voto de Fachin
Citado por Deltan Dallagnol em mensagens anteriores publicadas pela série de reportagens da Vaza Jato (“Aha uhu o Fachin é nosso”), o aliado da ‘República de Curitiba’ foi leal aos moços trapaceiros da Lava Jato. Ele foi o único a dar razão à defesa dos procuradores. Em seu voto, o magistrado enumerou as fundamentações do agravo, em concordância à tese dos peticionantes.
“São basicamente três: eventual utilização indevida sem autenticidade apreendida pela operação Spoofing, o que viola a garantia fundamental; o reclamante [Lula] não tem legitimidade para pleitear acesso aos arquivos, porque seu celular não foi invadido, o reclamante não é vítima; laudo da Polícia Federal atesta apenas e tão somente que o conteúdo apreendido não poderia ser editado sem o conhecimento da PF, mas não atesta a veracidade do conteúdo."
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